Bolsonaro disse que ministros estavam “recebendo milhões” para fraudar eleições. Questionado em interrogatório, admitiu não ter provas
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), interrogado hoje (10) pelo ministro Alexandre de Moraes no inquérito que investiga articulações golpistas após as eleições de 2022, admitiu que não tinha provas para as graves acusações que fez contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Entenda na TVT News.
Em uma reunião registrada em vídeo, e que se tornou peça central do processo, Bolsonaro acusou nominalmente os ministros Moraes, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin de envolvimento em fraudes eleitorais e até de receber propinas milionárias. Questionado sobre os fundamentos dessas afirmações, o ex-presidente respondeu: “Nenhum. Era um desabafo, uma retórica”.
Bolsonaro contra a Justiça Eleitoral
Durante o interrogatório, Moraes confrontou Bolsonaro com trechos da reunião em que o então chefe do Executivo afirmou: “Fachin não tem limite. Não vou falar que ele está levando 30 milhões de dólares. Barroso, Alexandre está levando 50 milhões. Não tenho prova, pô. Mas algo esquisito está acontecendo. Vocês sabem da vida pregressa dos ministros”. Diante da leitura do trecho, Bolsonaro recuou: “Não tinha intenção de acusar os senhores de desvio de conduta”.
O interrogatório expôs a estratégia reiterada do ex-presidente de levantar suspeitas sobre o sistema eleitoral brasileiro sem apresentar qualquer comprovação. “Não tenho dúvida. Não tenho prova de muita coisa, mas tenho dúvidas”, disse Bolsonaro em outro momento da reunião. Moraes então questionou diretamente o ex-presidente sobre quais fundamentos sustentavam a tese de que as eleições teriam sido fraudadas. Bolsonaro respondeu vagamente, afirmando que “peritos criminais dizem que todo sistema eletrônico e computacional tem fragilidades”, e que a desconfiança era “compartilhada por muitos”.
Voto impresso
Bolsonaro também tentou justificar seu discurso insistente contra as urnas eletrônicas com a alegação de que “batalhou pelo voto impresso”, e disse que o Supremo Tribunal Federal havia declarado a proposta inconstitucional por razões de segurança do sistema. Ainda assim, sustentou que houve um “prejuízo” à sua campanha, ao citar decisões judiciais que o impediram de usar imagens do 7 de setembro, ou de acusar publicamente o adversário Lula de defender o aborto.
Ao ser confrontado por Moraes sobre a natureza da reunião, que o ministro classificou como parte de uma tentativa de “deslegitimação da Justiça Eleitoral”. Bolsonaro disse que o encontro “não era para ser gravado” e que a gravação foi divulgada “de má fé”.
Em outro ponto do depoimento, o ex-presidente voltou a mencionar um inquérito da Polícia Federal sobre possíveis ataques de hackers ao sistema do TSE, insinuando que senhas de ministros e diretores teriam sido capturadas. O próprio Bolsonaro, porém, não apresentou nenhuma prova de que esses supostos acessos teriam alterado resultados ou comprometido a integridade do pleito.
A insistência do ex-presidente em levantar dúvidas sobre a lisura das eleições, combinada com acusações sem provas contra ministros do STF e articulações com militares em reuniões secretas, está no centro das investigações que podem levá-lo a ser condenado por tentativa de golpe de Estado e outros crimes contra o Estado democrático de direito.
“Vamos metralhar?”
Em determinado momento, ele afirmou: “Vamos esperar chegar 2023 ou 2024 para nos foder? Por que não tomamos providência? Vou botar tropa na rua, metralhar?”
Reunião com embaixadores e blitz da PRF
Sobre o suposto inquérito citado por Bolsonaro que revelaria “vulnerabilidade” nas urnas eletrônicas, Moraes rebateu: “Na verdade não há nenhuma dúvida sobre o sistema eletrônico, e esse inquérito não tem absolutamente nada a ver com as urnas eletrônicas, absolutamente nada”. “Foi um hacker que ingressou e pegou um banco de dados de servidores”, esclareceu o ministro.
Na sequência, citou reunião de Bolsonaro com diversos embaixadores ocorrida em 19 de julho de 2022, quando reiterou ataques à Justiça Eleitoral, ao Poder Judiciário e lisura das eleições. Na ocasião, Bolsonaro chegou a afirmar que “Não é o TSE que conta os votos, é uma empresa terceirizada”.
Tentando justificar a reunião, Bolsonaro citou que Dilma também se reuniu com embaixadores mas “o assunto foi outro”. E citou ainda o ministro Edson Fachin, que também se reunião com representantes estrangeiros, para repor a confiança no sistema eleitoral.
Bolsonaro reafirmou a sua militância histórica pelo voto impresso, “É uma coisa minha desde muito tempo”, mas reconheceu que exagerou nos ataques. “Se exagerei na retórica, devo ter exagerado com toda certeza. Mas minha intenção, meu objetivo, sempre foi mais uma camada de proteção nas eleições, de modo que evitasse qualquer suspeição”.
Atribuiu ainda o vício da retórica estridente ao período que atuou como deputado, que tem imunidade parlamentar garantida pela Constituição. Assim, acabou “trazendo para o Executivo”, o estilo de retórica inflamada, tendando justificar os ataques.
Na sequência, Moraes quis saber se Bolsonaro teve conhecimento das operações realizada pela Polícia Rodoviária Federal no dia do segundo turno das eleições de 2022. A imputação que é feita na acusação é que foram direcionadas blits para onde o candidato adversário – o presidente Luiz Inácio Lula da Silva – tinha obtido mais votos no primeiro turno, principalmente na região nordeste. O ex-presidente negou ter tomado conhecimento dessas operações. “O que fiquei sabendo sobre isso, após o ocorrido, é que nenhum eleitor deixou de votar nessas regiões”, alegou.
O interrogatório segue. Acompanhe ao vivo na TVT.
Com colaboração de Tiago Pereira