sexta-feira , 25 de abril 2025

Revolução dos Cravos: Portugal escolhe a liberdade

Há 51 anos, os portugueses defendiam a democracia, igualdade e solidariedade tendo uma flor como símbolo. Foi a Revolução dos Cravos

Em 25 de abril de 2025, Portugal celebra 51 anos da Revolução dos Cravos — um dos marcos da luta contra o autoritarismo na história contemporânea. A data, feriado nacional conhecido como “Dia da Liberdade”, lembra o levante militar e popular que pôs fim a quase meio século de ditadura salazarista, de viés de extrema direita. Entenda na TVT News.

Mais do que um evento histórico, o 25 de Abril representa o renascimento da democracia portuguesa, simbolizada pelos cravos vermelhos nos canos de espingardas. Para marcar a data, uma série de manifestações, passeatas e festivais tomam diversas cidades portuguesas. Trata-se de um movimento orgânico, popular, que conta com a organização de movimentos sociais, comissões e inclusive com financiamento do Estado.

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Revolução dos Cravos: população se levanta contra a ditadura de Salazar. Foto: Arquivo/PT

A Revolução dos Cravos vista de fora

Rodrigo José, brasileiro que vive há mais de três anos em Portugal, fala com admiração sobre a Revolução dos Cravos.


“As festas acontecem em várias cidades do país. A principal em Lisboa e outras cidades também têm. Aqui no Porto tem muitas comemorações ao longo do mês. Exposições, palestras, um monte de coisas, shows, ao longo do mês. E o a grande ato no dia 25 de abril.” — Rodrigo José, residente no Porto.


Ele conversou com a TVT News e disse que estará presente nas comemorações em sua cidade. “Pra os portugueses, a democracia é muito cara. Eles sabem o quanto sofreram na ditadura e agora comemoram. Você vê muitos idosos na rua, comemorando. Juventude, gente nova também comemorando. Até as pessoas mais de direita, mais pegada bolsonarista, no 25 de abril respeitam. É muito sério”, disse.

Como disse o brasileiro, mesmo pessoas alinhadas com políticas de extrema direita, como o partido Chega, rejeita a ditadura, diferente de seus correspondentes ideológicos no Brasil. “O Chega fala muita asneira, aproveitam a data pra falar asneira mas não é igual ai que bolsonaristas comemoram a ditadura. O país é tomado por um clima de comemoração histórica de coisas que são necessárias para não voltarmos a ter. Percebemos isso nas pessoas, na galera”, disse.

Caminho até a queda

A trajetória que levou ao 25 de Abril começou muito antes de 1974. Portugal, embora detentor de um vasto império colonial, vinha enfrentando uma série de crises políticas desde a queda da monarquia em 1910. A instabilidade culminou com o golpe militar de 28 de maio de 1926, que deu origem à Ditadura Nacional. Em 1933, o economista António de Oliveira Salazar transformou o regime em Estado Novo, instaurando um governo autoritário de partido único — a União Nacional.

Salazar, oriundo de uma família humilde e formado em Direito pela Universidade de Coimbra, assumiu primeiramente o cargo de ministro das Finanças em 1928. Conquistou prestígio das elites ao equilibrar as contas públicas com uma política de austeridade. Mas esse controle orçamentário teve um alto custo social: cortes na educação e saúde, aumento de impostos e repressão política severa. Sob o regime salazarista, a liberdade de expressão foi suprimida, sindicatos foram dissolvidos e presos políticos eram enviados a campos de concentração, como o instalado em Cabo Verde.

Queda da cadeira

Curiosamente, Salazar não testemunhou o fim do regime que fundou. Em 3 de agosto de 1968, aos 79 anos, sofreu uma queda ao sentar-se numa cadeira e teve lesões cerebrais irreversíveis. Mesmo com seu estado de saúde debilitado, Salazar acreditava que ainda governava. Os ministros encenavam reuniões à beira de seu leito. O verdadeiro poder, entretanto, passara para Marcelo Caetano, nomeado pelo então presidente Américo Tomás.

Marcelo, contudo, manteve a rigidez do regime. Envolvido nas guerras coloniais em Angola, Guiné-Bissau e Moçambique — conflitos que consumiam vidas e recursos —, ele enfrentava crescente insatisfação popular e militar. Para tentar conter o desgaste nas tropas, aprovou decretos que favoreciam a rápida promoção de oficiais mais jovens, o que provocou revolta entre os quadros experientes das Forças Armadas. Esses fatos iam desencadear a Revolução dos Cravos.

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Revolução dos Cravos: Curiosamente, Salazar não testemunhou o fim do regime que fundou. Foto: Arquivo/PT

O Movimento dos Capitães

Foi nesse contexto que surgiu, em setembro de 1973, o Movimento das Forças Armadas (MFA), formado por capitães e oficiais de patentes intermediárias. Liderado por figuras como Otelo Saraiva de Carvalho e Salgueiro Maia, o grupo se articulou em segredo para derrubar o governo.

A comunicação da ofensiva foi feita de forma criativa e simbólica: duas canções transmitidas pelo rádio marcariam o início da revolução. Às 23h do dia 24 de abril de 1974, tocou “E depois do adeus”, de Paulo de Carvalho. Pouco depois, às 00h20, soou “Grândola, Vila Morena”, de Zeca Afonso — um hino à fraternidade e à igualdade. O sinal estava dado.

Tanques saíram às ruas, especialmente na Avenida da Liberdade, em Lisboa. Sob o comando de Salgueiro Maia, uma coluna de 240 militares da Escola Prática de Cavalaria de Santarém tomou pontos estratégicos da capital sem disparar um tiro sequer.

O cravo como símbolo

No mesmo dia da Revolução dos Cravos, um gesto singelo tornou-se eterno. A senhora Celeste Caeiro, garçonete de um restaurante que havia comprado cravos para comemorar seu aniversário de fundação, foi dispensada do trabalho e, no caminho de volta, cruzou com soldados em tanques. Um deles lhe pediu um cigarro. Como não tinha, ofereceu um cravo. O gesto se espalhou entre os soldados e, em pouco tempo, floristas da cidade distribuíam as flores aos militares. Nascia assim o símbolo da revolução: os cravos vermelhos nos canos das armas, ícone máximo de uma revolução sem sangue.

Revolução dos Cravos e liberdade

Ao fim do dia 25 de abril de 1974, o Estado Novo havia caído. Marcelo Caetano se rendeu no Quartel do Carmo, encerrando oficialmente o regime. A revolução abriu caminho para a descolonização da África e a realização das primeiras eleições democráticas, em 1975. Desde então, Portugal trilhou um caminho de modernização, integração europeia e fortalecimento das instituições democráticas.

Hoje, os cravos continuam a florescer nas ruas todos os anos. São pintados em murais, usados como acessórios, ensinados nas escolas. Representam a memória coletiva de um povo que escolheu a liberdade.

Em 2024, aos 91 anos, Celeste Caeiro voltou à Avenida da Liberdade para celebrar os 50 anos da revolução. “Vou ficar na história”, disse em entrevista à TV portuguesa SIC. E ficou.

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